25
Mar 09

O Predador e a Presa

Não acreditava em ti. Sempre foste omissa na verdade. Escorregadia quando o assunto não te interessava, ou ameaçava o teu segredo. Espetava pequenos alfinetes na enorme couraça que tinhas montada em volta das tuas histórias, credíveis demais para serem postas em causa. Aquele sorriso sequestrador, tornava-me um capricho nas tuas mãos. Um pequeno papagaio voando escorregadio pelas correntes de ar ascendente.

Já conhecia os cantos à casa e previsivelmente era na escuridão que eu temia mais a tua furtiva aproximação. Vivias em locais escondidos, à mercê da minha coragem que nunca chegou a aparecer.
 

O silêncio do que nunca dissemos encheu-me de uma ansiedade salgada. Um sal que me secou como um peixe ao sol, lentamente preenchendo tudo o resto com a falsidade que eu antes não conhecia. Noite após noite desaparecias para lugares que para mim não existiam onde predadora colhias o teu alimento.
 

Prometes-te que me contavas quando precipitada sobre o meu pescoço escondeste o desejo que fervia a tua vontade. Os teus olhos desumanos pregaram-se ao reflexo da janela, a mesma que nos separava das afugentadas árvores sacudidas pela intempérida. Sussurraste que tinhas de partir, nunca mais nos iríamos ver… Era para o meu bem dizias tu entre o inesquecível bater da porta!
 

Lutei por me mentir, dia após dia, fingindo ser o amigo que te conhecera. Um amigo das más horas, dos desejos e das loucuras. Um amigo que entrava no teu quarto quando tudo estava escuro e arrastava o teu calor para o aconchego dos meus braços. Mas até esse partiu, levado por ti. Em seu lugar ficou uma carcaça vagabunda que agora preenche a sala de tua casa. Um moribundo de olhar pregado às tuas fotos, aquelas onde ainda vivias a nossa vida, dona e senhora do teu sorriso e da tua mentira.
 

Fui fraco onde tu foste forte, mas como tudo o resto esse era mais um resultado da nossa invulgar convivência! Agora que penso, sempre fui conivente, talvez porque me convinha ser teu sem reservas nem barreiras. Estar à tua disposição, à distância de uma chamada.

Acabei por me deixar morder por uma das tuas amigas. Ela disse-me que não havia caminho de volta. Era isso que eu queria… Chega desta fome compulsiva onde o desejo de te ter é superior à praga a que me entreguei. Percorro as noites á tua procura. Mordo e mato, vivo e morro, sem saber que me protegias. Que até talvez tenhas partido para me amar à distância como eu era para ti! Como éramos um para o outro…


Uma presa a viver com o seu predador.

publicado por sangue-fresco às 11:02

Adorei, muito bom mesmo!
Telma Teixeira a 26 de Março de 2009 às 11:33

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